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23 de julho de 2024Reintegração de posse ocorrerá na terça-feira em favor da Suzano, condenada por grilagem de terras
As 120 famílias que ocupam uma área na comunidade de Bom Jesus, situada em Conceição da Barra, no norte do Estado, terão que deixar o espaço na próxima terça-feira (23). Nessa quinta (18), o juiz Antonio Moreira Fernandes negou um novo pedido de reconsideração e determinou o cumprimento da ação de reintegração de posse em favor da Suzano Papel e Celulose (ex-Aracruz Celulose e ex-Fibria), empresa condenada em 2021 por grilagem de terras.
Na última terça-feira (16), foi realizada também uma reunião preparatória para a ação de reintegração a ser realizada. Estiveram presentes no encontro representantes da Comissão de Conflitos Fundiários do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES); da Polícia Militar do Estado (PMES); da Suzano; do mandato da deputada estadual Camila Valadão (Psol), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa; e integrantes da própria ocupação.
O terreno em questão fica em uma área rural às margens da rodovia ES 010, no quilômetro 258, e o acampamento foi montado em 2019, sem a participação inicial de organizações representativas dos movimentos de luta por reforma agrária. Com o tempo, famílias acampadas foram se desenvolvendo como pequenas produtoras rurais, com plantações de cacau, maracujá, café, pimenta do reino, dentre outros produtos.
O processo relativo à ocupação do terreno estava tramitando na Justiça Federal, devido à possibilidade de haver quilombolas entre os acampados. A defesa dos acampados, que é realizada por uma advogada particular, alega também que a área que a Suzano pleiteia que seja reintegrada ao seu patrimônio está entre os imóveis do processo de grilagem de terras no qual foi condenada.
O Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação em 2013 no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (processo 0000693-61.2013.4.02.5003), pedindo a anulação da titulação de 30 imóveis, localizados em Conceição da Barra e São Mateus, concedidos pelo Estado à Suzano nos anos 1970, quando ainda se chamava Aracruz Celulose. Parte dessas áreas se sobrepõem aos territórios quilombolas do Sapê do Norte. O MPF também solicitou a suspensão de qualquer financiamento direto do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) à papeleira.
Fraudes nas titulações foram descobertas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Aracruz, criada em 2002 pela Assembleia Legislativa. Na época, foi constatada a existência de um acordo entre a Aracruz Celulose e vários funcionários para que estes requeressem a legitimação da posse de terras públicas estaduais, nos anos 70, a fim de transferi-las à empresa.
Uma primeira decisão judicial condenando a papeleira foi proferida em outubro de 2021, quando o juiz determinou a suspensão dos títulos de propriedade fornecidos pelo Governo do Estado à então Fibria. O processo ainda tramita no Poder Judiciário.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) esteve na ocupação da comunidade de Bom Jesus no fim de 2023, mas manifestou-se dizendo que não havia ali remanescentes de territórios quilombolas. A ação, então, retornou à esfera estadual, apesar de a defesa dos ocupantes continuar alegando que a tramitação deveria continuar no âmbito federal, tendo em vista a ação contra a titulação das terras pela Suzano.
A primeira decisão pela reintegração de posse após o retorno do processo para o TJES (processo 5000070-48.2024.8.08.0015) foi emitida no último dia 18 de março. No dia 2 abril, um pedido de reconsideração foi rejeitado. No dia 13 de maio, a Justiça ratificou a necessidade de cumprimento e deu prazo de 15 dias para a desocupação. E, mais uma vez, o pedido de reintegração de posse da Suzano foi acatado nessa quinta-feira. Entretanto, a primeira reunião preparatória ocorreu apenas nessa terça.
“(…) em que pese as alegações da requerida da existência de ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal em face dos autores desta, oportuno ressaltar que não há notícias de cancelamento do direito de propriedade da empresa autora, e que, ainda se assim fosse, o presente feito trata-se de matéria possessória, instituto diverso da propriedade” escreveu o juiz Antonio Moreira Fernandes na sentença, alegando ainda que foi feito um plano para resguardar os direitos das pessoas em vulnerabilidade presentes na ocupação.
Os integrantes da ocupação consideram que foi dado um prazo muito apertado para a retirada de seus pertences. “A praxe é, depois da reunião preparatória, dar 30 ou 40 dias pra executar essa ação. A gente entrou com alguns recursos na Justiça e acreditávamos que conseguiríamos reverter essa reintegração. Demoramos seis anos para construir algo, e dentro de uma semana, vamos ter que tirar tudo?”, desabafa uma integrante da ocupação, que prefere não se identificar por medo de represálias.
A deputada Camila Valadão afirma que tem acompanhado o processo relativo à ocupação em Conceição da Barra e vai cobrar do governo estadual a garantia dos direitos das famílias. “O governo estadual também tem uma Comissão de Conflitos Fundiários, e o que nós cobramos, é que tudo aquilo que foi previsto como um conjunto de ações sociais para essas famílias seja garantido, como o aluguel social”, destaca.
Fonte: Século Diário